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VINTE ANOS DA LEI DOS PLANOS DE SAÚDE

03 de junho / 2018
Direito nas Áreas Médica e de Saúde

No dia 03/06/2018, a Lei n. 9.656/98 completou 20 anos. De lá para cá, a Lei sofreu muitas alterações, restando intactos apenas 2 artigos. Foram muitas as alterações efetuadas nessa Lei, com destaque para uma grande reforma realizada em 2001. Hoje, o Congresso discute novamente uma ampla revisão dessa norma.

Mas o que mudou, substancialmente, de lá para cá?

Primeiro é importante entender como eram as práticas desse segmento antes da referida Lei. Por não haver uma regulamentação específica, valiam as regras contratuais e muitas das cláusulas impostas pelas operadoras eram extremamente abusivas, como por exemplo a limitação de diárias de internação e de sessões de hemodiálise; exclusão de cobertura para o tratamento de algumas doenças, como a AIDS; exclusão de cobertura de órteses, próteses e materiais de síntese, mesmo quando ligados ao ato cirúrgico.

Com o implemento do Código de Defesa do Consumidor, em 1990, muitas dessas cláusulas passaram a ser consideradas abusivas e, portanto, nulas, pelo Poder Judiciário.

Algum tempo depois, a Lei dos Planos de Saúde foi aprovada e muito daquilo que o Poder Judiciário já vinha julgando como abusivo foi incorporado a essa nova legislação.

Nesses 20 anos de existência da Lei, o mercado de planos de saúde passou por muitas mudanças.

Até o final da década de 90, plano de saúde era um produto acessível a poucas pessoas, chegando até mesmo a figurar na lista de maiores desejos da população brasileira.

Cerca de 10 anos após a Lei, o produto se tornou mais acessível pela classe média. Além disso, muitas empresas passaram a oferecer o benefício aos seus empregados, em alguns casos por força de norma coletiva, mas em muitos casos o intuito era o de atrair e reter talentos, já que o plano de saúde é um dos benefícios mais desejado pelos empregados.

Mais recentemente, principalmente a partir de 2014, o preço desse serviço aumentou substancialmente. Os novos produtos passaram a ser mais caros e os antigos acumularam reajustes muito elevados, bem acima da inflação, que tornaram a mensalidade cada vez mais difícil de pagar, obrigando muitos consumidores a cancelarem seus planos de saúde.

As empresas empregadoras, por sua vez, têm cada vez menos interesse em oferecer esse benefício aos seus empregados, já que essas empresas são as que sofrem os reajustes mais elevados.

E o que precisa mudar?

REAJUSTES ANUAIS

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) regulamenta apenas o reajuste anual de mensalidades dos planos de saúde contratados na modalidade individual/familiar, que representam, atualmente, apenas 19,31% do total de beneficiários.

Para o restante dos contratos, o reajuste anual é estabelecido pela operadora de saúde, sem interferência da ANS.

A Agência reguladora parte da falsa premissa de que, nos contratos coletivos, em razão de o contratante do plano de saúde também ser uma empresa, a livre negociação entre essa empresa contratante e a operadora do plano de saúde seria capaz de oferecer vantagens melhores aos beneficiários desses contratos.

Na prática, o reajuste das mensalidades desses contratos é muito superior ao dos planos individuais e não há nenhuma vantagem efetiva para esses consumidores.

REAJUSTE POR FAIXA ETÁRIA

A Lei n. 9.656/98 permite a variação do preço em razão da idade, desde que os critérios, faixas etárias e percentuais de reajustes estejam previstos em contrato e desde que obedeçam às normas da ANS.

A primeira regra aprovada para esse tipo de reajuste constou da Resolução n. 6/1998, do Conselho de Saúde Suplementar, e estabeleceu que o valor da última faixa etária, que naquela época era a de 70 anos, não poderia ser superior a 6 vezes o valor da primeira faixa etária.

Com a aprovação do Estatuto do Idoso, em 2003, foi vedado o reajuste dos planos de saúde para quem atingisse a idade de 60 anos ou mais. A intenção do legislador era beneficiar o idoso, excluindo-se os reajustes etários então previstos para a faixa etária de 60 a 69 anos e a de 70 anos em diante.

A ANS, por sua vez, diante da proibição de reajuste etário para o idoso, aprovou uma nova Resolução para entrar em vigor na mesma data do Estatuto do Idoso, na qual ficou definida como última faixa etária a idade de 59 anos em diante.

A ANS, no entanto, manteve a mesma regra de limite de aumento para a última faixa etária, agora aos 59 anos, de até 6 vezes o valor da primeira faixa, o que, na prática, antecipou o reajustamento máximo do plano de saúde em razão da idade em 11 anos.

Assim, se o Estatuto do Idoso teve por princípio proteger o idoso, o que a ANS fez foi justamente o oposto. A partir de 2004, ano de início de vigência do Estatuto do Idoso, o consumidor passou a pagar aos 59 anos o valor que só pagaria aos 70 anos.

É importante preservar o objetivo do legislador ao aprovar o Estatuto do Idoso e diminuir o aumento máximo permitido entre a primeira e a última faixa etária.

Do contrário, seria melhor ter deixado as regras como eram até 2003.

FALTA DE OPÇÕES DE CONTRATAÇÃO DE PLANOS DE SAÚDE

O único produto que pode ser contratado por qualquer consumidor é o plano de saúde individual, mas as principais operadoras de saúde deixaram de comercializar esse produto, tendo em vista que este é muito mais vantajoso para o consumidor.

A Lei não obriga as operadoras a oferecer esse tipo de produto no mercado e, na verdade, nem era necessário na ocasião em que a Lei foi aprovada.

Hoje, no entanto, devido a escassez desse produto, a norma precisa ser revisada.

SELEÇÃO DE RISCO E PROTEÇÃO MAIOR AOS CONTRATOS EMPRESARIAIS COM ATÉ 29 VIDAS

É vedada a seleção de riscos pelas operadoras de saúde. A adesão do consumidor não pode ser recusada em razão de ele ser idoso ou portador de graves doenças.

A Lei dos planos de saúde veda a seleção de risco e essa vedação é reforçada por Súmula da ANS.

No entanto, na prática, há meios alternativos de as operadoras praticarem essa conduta ilícita.

Há muitos contratos coletivos empresariais que, na verdade, agregam apenas uma família sob o CNPJ da empresa em que uma das pessoas dessa família tem participação societária.

Quando essas pequenas empresas apresentam uma proposta de adesão com um número pequeno de beneficiários, a operadora analisa fatores que podem ensejar maior risco para o negócio, tais como beneficiários idosos ou com graves doenças.

Em muitos casos, a operadora acaba não aceitando a contratação.

Por ser um negócio havido entre duas pessoas jurídicas, a justificativa é falta de interesse comercial, mascarando o que, na verdade, é seleção de risco.

Outro problema importante que afeta os contratos empresariais com poucos beneficiários é a possibilidade de rescisão unilateral e imotivada pelas operadoras.

Findo o período de vigência de 12 meses, a operadora pode cancelar esse contrato.

Por ser um plano empresarial, os beneficiários não têm direito à portabilidade de carências e se tiverem que contratar um outro plano de saúde, terão que cumprir novos prazos de carência.

Mesmo que contratem outro plano em nome da empresa, ainda assim terão que cumprir carência, pois é vedada a exigência de carência em planos coletivos apenas a partir de 30 beneficiários.

É necessário implementar mais segurança e proteção para esses contratos empresariais com até 29 beneficiários.

MANUTENÇÃO DO PLANO DE SAÚDE PARA APOSENTADOS

A Lei assegura, nos artigos 30 e 31, o direito de manutenção do plano de saúde para aposentados e demitidos que, durante o vínculo do contrato de trabalho, tenham contribuído com uma parte do pagamento da mensalidade do plano, não sendo considerado contribuição a cobrança de coparticipação.

No que se refere aos aposentados, é permitida a manutenção do plano de saúde por 01 ano para cada ano de contribuição e, se tiver contribuído por 10 anos ou mais, o direito de manutenção passa a ser vitalício.

Na época em que a Lei foi aprovada e também quando houve a alteração do texto do artigo 31, no ano de 2001, era comum que empregados permanecessem na mesma empresa por muitos anos.

A realidade hoje é diferente e é bastante difícil um empregado permanecer na mesma empresa por 10 anos ou mais e ainda contribuindo com o pagamento do plano de saúde.

Os empregadores, inclusive, têm optado por não cobrar mais do empregado uma contribuição para o pagamento da mensalidade do plano de saúde, justamente para que o empregado não tenha o direito de manter esse benefício após o término do vínculo de emprego *** (vide nota de rodapé).

Com a mudança desse cenário, a Lei precisa se adaptar.

Na proposta de alteração de Lei em trâmite no Congresso, há previsão de reduzir o tempo de contribuição para 5 anos para o aposentado ter direito à manutenção do plano por tempo vitalício.

Ainda que essa proposta seja aprovada, é importante assegurar a esses aposentados o direito de manter o plano de saúde, mesmo que não tenha havido contribuição, já que o plano de saúde faz parte da remuneração do empregado.

Ele é considerado salário indireto, pois é como se o empregador pagasse um salário menor e o complementasse com o benefício, ao invés de pagar um salário que permitisse ao empregado pagar diretamente por um plano de saúde.

Sem essa garantia, muitos aposentados não conseguirão manter o plano de saúde e, já em uma idade mais avançada, não conseguirão contratar um outro plano de saúde por falta de opção ou terão que pagar muito mais caro por isso.

ESTÍMULO PARA EMPREGADORES OFERECEREM PLANO DE SAÚDE AOS EMPREGADOS

As empresas empregadoras são as maiores consumidoras de planos de saúde no país, mas há pouca proteção legal do interesse dessas empresas, bem como baixa representatividade perante a ANS, conforme já abordado nesse blog em outra oportunidade, vide: Brasil não incentiva empresas a oferecer planos de saúde para empregados.

____________________________________________

*** Apesar de o empregado aposentado assumir o custo integral da mensalidade, ele permanece vinculado ao contrato coletivo empresarial do ex-empregador. Em geral, os aposentados são pessoas idosas e pessoas idosas têm o risco de utilizar mais o plano de saúde. Quanto mais se utiliza o plano de saúde coletivo, maior é a sinistralidade e quanto maior é a sinistralidade, maior é o reajuste anual aplicado sobre todo o contrato. É por isso que os empregadores não querem mais que o ex-empregado, principalmente o aposentado, tenha direito de manter o benefício.

 

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advogado especialista em direitos do paciente direito do consumidor lei 9.656/98 lei dos planos de saúde Planos de Saúde
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Rodrigo Araújo
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